Art Annette Schmucker
- Claro que não. Adoro o meu Miguel. Casei com
ele não por vingança mas um pouco por impulso, por paixão… O casamento é
sagrado! Mas não esqueço o que o outro me fez. Foi um cabrão e disso não passa.
- Nunca ouviste dizer que “os traidores são colhidos
na sua própria cobiça”? Esquece, Joana. Não merece sequer que penses nele, não achas? Pensa no Miguel, o
teu amor.
- No meu doce - e sorriu.
Adoro-o. Amei-o assim que o vi. O coração quase
parou, o corpo num arrepio de tesão, um tormento que não sei explicar, um magnetismo
que me deixou frágil e a flutuar, Ana. Ele faz-me sentir bem, quase em êxtase
permanente. Quando estamos juntos só quero mesmo é cheirá-lo, saboreá-lo,
comê-lo todo.
- Malandra que me saíste!
- Malandra eu? Sabes bem que gosto de sexo. E
com o Miguel…parece que ainda gosto mais do que já gostava.
Joana ri de barriga cheia, de plenitude ou mera
felicidade.
Quando ela saiu e fiquei novamente só, reli as
palavras de Shakespeare, no livro que Roberta me oferecera como retribuição
pela minha capacidade de ouvir e muita paciência. A minha vida preenchida pelas
perdas e amores dos outros, desgostos, traições e sentimentos de seres
imperfeitos. Uma roda em que, novamente, sou eu o centro para onde os raios
convergem. É esse o meu karma? “E a minha roda está redonda ou toda torta?”
penso, “Colorida ou mais a preto e branco?”.
O que faço aos intervalos em que sinto a boca
seca?
Maria Luís Koen
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