quarta-feira, 21 de maio de 2014

A Roda - capítulo 11- O clã começa a chegar







11. 
O clã começa a chegar. Por ser de noite e a lua, cheia, entrar pelos vidros da grande janela da sala, lembrei-me da casa da lua. Mas não sei se todas estamos menstruadas. Quando, noutros tempos, as mulheres se juntavam em grupo, durante um determinado período de tempo, menstruavam juntas. Está provado que acontece assim, qualquer ginecologista dirá o mesmo. Tal facto conferia-lhes um grande poder. Vários grupos de mulheres reuniam-se em tendas a que chamavam  “tendas vermelhas” , numa clara alusão ao sangue. Juntas nessas tendas, menstruavam e eram poderosas por isso. Essas tendas também tinham outro nome: eram as "casas da lua". O sangue menstrual era considerado sagrado - sangrar sem morrer era poderoso e mágico - para as mulheres da Idade da Pedra e, ao longo dos anos sempre existiram rituais femininos ligados à menstruação. Ainda existem hoje. Por exemplo, existia o ritual chamadoThesmophoria. A sua origem perde-se no tempo. Era um ritual realizado anualmente pelos gregos quando se semeava. Reuniam as mulheres que se encontravam na menarca (primeira menstruação). Esse encontro acontecia num campo considerado sagrado, e ao primeiro sinal da primeira menstruação, as raparigas passavam por uma fenda para levar a sua oferenda – o sangue menstrual. Faziam, então, outras oferendas às divindades: a oferta do melhor leitão que existisse numa  ninhada é um exemplo. Quando a carne do leitão morto ficava podre, juntavam-lhe o sangue menstrual e as sementes. Só depois de todos estes passos é que tudo era finalmente enterrado. Era este o contributo, considerado sagrado, das mulheres, para que a colheita desse ano fosse abundante. 
Como este, há muitos rituais, ligando o sangue menstrual a um poder sagrado que só as mulheres detinham: o de sangrarem vários dias, todos os meses, sem morrer. No entanto, ao longo dos milénios muitos destes rituais e celebrações foram desaparecendo ou foram sendo esquecidos ou foram-se tornando quase secretos, alguns até foram considerados como parvoíces de mulheres incultas das aldeias. A menstruação foi sendo cada vez menos apreciada e nos anos 50, 60 ou 70, em Portugal, por exemplo, era praticamente um assunto maldito ou secreto, tabu, considerado uma coisa suja, que só as mulheres tinham, e que devia ser escondido dos outros, até dos próprios maridos. A escritora Mirella Faür é clara: "Enquanto que nas sociedades matriarcais as sacerdotisas ofereciam o seu sangue menstrual à Deusa e faziam suas profecias durante os estados de extrema sensibilidade psíquica da fase menstrual, a Inquisição atribuía a esse poder oracular a prova da ligação da mulher com o diabo, punindo e perseguindo as mulheres 'videntes'”.
Maria Luís Koen


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