continuação
João Alfaro
- O chá
está quase pronto. Queres bolachas?
- Só se forem de manteiga - responde.
Procuro nos armários pois sei que me deve restar um pacote de
bolachas. Ah, aqui estão. Junto um prato cheio delas ao tabuleiro que levo até
à salinha.
- Belo chá.
- Sim é bom- digo a sorrir.
- Venho da casa da Mafalda.
- Mafalda? Não conheço. É tua colega?
- Não.
Parece-me haver uma ligeira hesitação mas,
logo de seguida, continua :
-É
minha amante.
Por momentos julgo não ter ouvido bem. Bebo
mais um gole de chá. A vida às vezes é estúpida e dura e má e nós também. Os
dias passam tantas vezes vazios de substância, sempre os mesmos, frios e
deformados, semanas e meses em que nada acontece, em que é sempre
tudo o mesmo, em que as pessoas que conhecemos nos massacram de nada ou dos
seus cansaços que são nossos. Outras vezes parece que tudo isso muda, que há um
tremor qualquer que tudo vai agitar, tal bola de neve, agita-me a mim e vai
agitar o outro e por aí fora, sem parar. Então aparecem mil estórias que
preenchem, vêm ter connosco e nós, mesmo assim, cheias do nosso próprio vazio, não entendemos nada.
-Amante??
Maria Luís Koen
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