domingo, 9 de junho de 2013

A Roda
continuação


João Alfaro

- O chá está quase pronto. Queres bolachas?
- Só se forem de manteiga - responde.
Procuro nos armários pois sei que me deve restar um pacote de bolachas. Ah, aqui estão. Junto um prato cheio delas ao tabuleiro que levo até à salinha.
- Belo chá.
- Sim é bom- digo a sorrir.
- Venho da casa da Mafalda.
- Mafalda? Não conheço. É tua colega?
- Não.
Parece-me haver uma ligeira hesitação mas, logo de seguida, continua :
 -É minha amante.
Por momentos julgo não ter ouvido bem. Bebo mais um gole de chá. A vida às vezes é estúpida e dura e má e nós também. Os dias passam tantas vezes vazios de substância, sempre os mesmos, frios e deformados, semanas e meses em que nada acontece, em que é sempre tudo o mesmo, em que as pessoas que conhecemos nos massacram de nada ou dos seus cansaços que são nossos. Outras vezes parece que tudo isso muda, que há um tremor qualquer que tudo vai agitar, tal bola de neve, agita-me a mim e vai agitar o outro e por aí fora, sem parar. Então aparecem mil estórias que preenchem, vêm ter connosco e nós, mesmo assim, cheias do nosso próprio vazio,  não entendemos nada.
-Amante??

Maria Luís Koen



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